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quarta-feira, 14 de julho de 2010

TEXTO 13 - FILÓSOFOS A MANCHEIAS.


O Brasil não tem 143 filósofos. Nenhuma nação tem 143 filósofos. Pode-se, mesmo, pensar que todas juntas não terão 143 filósofos. Contudo, são tantos os que Jorge Jaime encontrou ao escrever a “História da filosofia no Brasil” (4 vols. Petrópolis/S. Paulo: Vozes/Faculdades Salesianas, 2001). São editoras católicas, sendo o autor presidente da Academia Brasileira de Filosofia. Devemos, em conseqüência, prestar atenção, tanto mais que se trata de um “puro beneditino, um perfeito beneditino”, na avaliação de Antônio Carlos Villaça.
Como chegou àquele número? Incluindo, entre outros, o marquês de Maricá, esse moralista suburbano, cabeça pensante do Segundo Reinado, a quem ficamos devendo os imortais princípios de sabedoria coligidos nas “Máximas, pensamentos e reflexões”, reeditadas em 1958 pela Casa de Rui Barbosa, que assim os juntou num estimulante exercício de contrários. Cabe afirmar, sem ironia, que nenhum outro livro nos ajuda a melhor compreender o Brasil e, em particular, o Brasil do século XIX. Eis, por exemplo, um dos seus apotegmas, a ser inscrito no frontão dos nossos estabelecimentos de ensino: “Não é menos funesto aos homens um superlativo engenho do que às mulheres uma extraordinária beleza: a mediocridade em tudo é uma garantia e penhor de segurança e tranqüilidade.”
Ninguém poderia tê-lo dito melhor. No que se refere à literatura, ele ensinava que “o desejo da glória literária é de todas as ambições a mais inocente, sem ser todavia a menos laboriosa.” Ele sabia do que estava falando. Poucos filósofos terão chegado a tão vertiginosas conclusões sobre a vida pública: “As revoluções políticas, quando não melhoram, deterioram necessariamente a sorte das nações.” Rui Barbosa jamais pensou nisso, porque não era homem de pensar por tautologias e banalidades: não foi, certamente, um filósofo, nem no próprio, nem no figurado, como tantos outros que Jorge Jaime anexou ao seu elenco, mas, pensador e doutrinário, esteve imerso na vida das idéias. O autor apresenta-o como um espírito desorientado, vagando de sistema em sistema, até chegar, afinal, ao porto seguro da fé católica (que, como Alceu Amoroso Lima, denomina de “espiritualismo”): “O retorno ao espiritualismo, que lhe devolvera a tranqüilidade em vão buscada nas filosofias (...)” — estamos informados.
Resta saber se a história dos pensadores que, de perto ou de longe, interessaram-se pela filosofia, pode ser aceita como história da filosofia, que epistemologicamente só pode ser a história dos sistemas que se respondem uns aos outros num desenvolvimento orgânico. Muitos se acreditam filósofos simplesmente por terem lido livros de filosofia ou se especializarem na exegese dos que a criaram, assim como Fidelino Figueiredo dizia que ler muitos livros de história não transforma ninguém em historiador.
Há, portanto, uma distinção a ser feita entre, por um lado, os estudiosos de filosofia, praticantes do pensamento reflexo, e, por outro, os criadores do corpo de idéias que realmente a constituem. A maior parte dos “filósofos” arrolados por Jorge Jaime foram apenas leitores de filosofia ou mostraram por esse ramo do conhecimento um interesse esporádico ou ocasional (é difícil, por exemplo, encarar como filósofo o Sílvio Romero divulgador de sistemas e doutrinas alheias, nem sempre com grande discernimento). Muitos outros são “filósofos” por serem professores de filosofia enquanto matéria didática, o que, diga-se de passagem, é tarefa imprescindível e nada tem de supérfluo (pelo contrário).
Observava-se, em livro recente, que “a maioria dos filósofos brasileiros tem o seu autor estrangeiro que é trazido para o Brasil, eu diria até abrasileirado, colocado dentro das condições do Brasil. O Paulo Arantes tem o Hegel, o Gianotti teve o Marx, hoje tem o Wittgenstein, Marilena Chauí tem o Espinosa, o Marcos Nobre tem o Adorno, e, vamos lá, o Carlos Nelson Coutinho tem o Gramsci” (Marcos Nobre/José Márcio Rego. “Conversas com filósofos brasileiros”. Ed. 34, 2000).
Jorge Jaime não contém a indignação contra os que algum dia ousaram contestar a existência de uma filosofia brasileira (o que é diferente de “filosofia no Brasil”, anfibologia que comete para fins polêmicos): “Mentiram-nos que o Brasil não possui filósofos, que a mente brasileira não é própria para elucubrações metafísicas, que não se acredita que, em breve, se venha a constituir, entre nós, um sistema original filosófico. Tudo isto li e ouvi dizer em aulas, conferências, congressos”. Ele não esconde a satisfação vingativa com que reuniu, afinal, em quatro volumes e 1.931 páginas, os 143 filósofos brasileiros, número impressionante que certamente pulveriza a mentira de Clóvis Beviláqua quando declarou, justamente a propósito de Sílvio Romero, que os brasileiros não tinham asas metafísicas.
Nem mesmo, ao que parece, asas da lógica. A onomástica triunfalista, com que o tratado se encerra, tinha sido desautorizada desde as páginas iniciais do primeiro volume, onde procurou justificar as nossas carências: “Nunca se explicará com suficiente exatidão o que determina a ausência de um verdadeiro filósofo no Brasil. Podemos recorrer aos argumentos da nossa juventude cultural, da nossa civilização incipiente, do autodidatismo dos nossos estudos, da falta, até há pouco, de cursos universitários e sistemáticos — mas são causas todas estas que uma personalidade verdadeira poderia vencer e ultrapassar. O que Farias Brito realizou, como debatedor de problemas e sistemas filosóficos, ele o teria realizado, como filósofo, se a sua constituição intelectual lhe houvesse reservado esse destino. Um filósofo, como um poeta, encontrará sempre em si mesmo os recursos necessários para a sua expressão, a despeito de quaisquer limitações locais ou temporais. A história da filosofia apresenta mais de um exemplo neste sentido.”
Se... Tudo esbarra, afinal de contas, nessa conjunção incontornável. O que Jorge Jaime está dizendo é que Farias Brito teria sido um grande filósofo se o tivesse sido... Tais especulações, além de gratuitas, confirmam os que “mentiram” a respeito de nossa filosofia, sem acrescentar qualquer parcela de convicção às reivindicações bem intencionadas de Jorge Jaime.
PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).
REFERÊNCIA:
http://www.secrel.com.br/tributos/wmartins.html

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